Com quantos Estrigas se faz uma cangalha? Desses de cá, cangalha e meia
é feita de um só. Mondubim que se ajuste a silêncio sábio de bigode aprumado no
rosto esguio desse pintor que beira século como se fosse nadica de nada. Menos
a memória do que o jeitão onde a lembrança já basta ou passa da conta, de
tamborilador dos casos que fizeram mundo, encanta ouvinte que nem precisa ser
desatento, esse vagueador insone.
Problema seu não é de resolver com guerra, mas basta palavra de bisturi
dissecando conceito ou palpite de tocha clareando moita duvidosa e, pronto.
Nariganga de berço, prestigiador vocacionado, cínico de filosofia escolhida,
olha de relance à volta deserta e prenuncia fim de mundo. Foi-se a dúvida e o
antigo duvidoso resta satisfeito.
De pincel a bacamarte é pulinho besta, ribomba o violeta cozido de rosa
e azul hortência, ladeado de amarelo, avizinhado de figura poética, casal
pênsil, solzinho dependurado na tarde longe, longe. Pintura é grito, meu rei!
A governança saída por ordem das cores deixa casamata, ganha os ares
depois de romper fronteira de ocasião. Atelier que nada, é um bunker, esconderijo
de esconder de Deus e refazer mundo desviado de sua belezura original! Entre um
silêncio e outro, palavra medida, desassossego nenhum e dois indicadores sob o
queixo. Tivesse três, estariam lá segurando peso de cabeça fervente entregue a
pensamentos apressados de não acontecerem.
Devagarzinho desliza outro assunto. História das Artes, filosofia
milenar na estética, desacontecimentos vão rebentando da traquinice intelectual
tão distintamente que parecem orvalho despencando à boquinha da noite. Vida inteira
devotando gosto à beleza esquiva de simplicidade suspirando paisagem discreta
onde tempo nem chega a ser ficção.
Estrigas traz por nome o mesmo do grande rio Africano nascido na borda
do Vitória, desembocado no Mediterrâneo. Perto do Nilo de cá, aquele de lá é
fio d’água, um riozinho de nada.
Artista irrequieto tem desafio de sobra. Dos maiores, um é superar, em
cada obra, o trabalho anterior fazendo trajetória cearense. Aos 95, Estrigas
mostra compreensão de segredos da luz, da composição e o domínio da forma.
Estilo criado nas letras, na arte e na vida sobejadas de virtudes invejáveis,
alcança o seu ápice e apresenta rara síntese de vida inteira. Aqui está, em
vinte quadros, o seu cinema.
por Carlos Macedo